Someone e a hipocondria
Bem....a Nocas arranjou uma bela frase, sim senhora...acho que a minha mãe também não ia compreender, mas vale o esforço!
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Ora, para antagonizar o recente laivo de intelectualidade literária da Nocas, lol, venho contar mais uma das nossas pobres aventuras com a nossa senhoria.
Someone era, sem qualquer dúvida, uma das pessoas mais hipocondríacas do mundo. Ela tinha consultas todas as semanas e quando não tinha, oh mas qual espírito humanista, acompanhava as amigas às delas. Someone era amiga das suas amigas. (Com excepção da vizinha da frente, mas essa história fica para outra vez).
Enfim, Someone era mesmo dada a isto de consultas e hospitais e centros de saúde e deixava todas as marcações na cozinha, num suporte na parede, para não se esquecer (como se isso pudesse acontecer...!). Claro que, na verdade, era apenas para que eu e a Nocas pudéssemos testemunhar as suas idas e vindas a todo o tipo de serviços de saúde da capital.
Tudo seria bastante normal, afinal a hipocondria não é uma coisa assim tão descabida e quem a tem não é porque escolheu ou porque acordou um dia e pensou, "oh como vou ser diferente dos outros?, ah já sei, vou ser hipocondríaco"... mas a forma como a encara é que define a sua personalidade (conformado, stressado, conspirador, etc,, há muitas variantes certamente) . Someone era...orgulhosa. Sim, porque as múltiplas palestras sobre doenças, operações, consultas e médicos prolongavam-se por largos minutos ou mesmo uma hora ou duas se Someone estivesse na disposição para falar (muitíssimo frequente), e se nos apanhasse na cozinha ou a entrar em casa (infelizmente acontecia) e, por vezes, até ia lá bater à porta do quarto e contar as suas provações.
Eu e a Nocas perdemos a noção das vezes que ouvimos as histórias de Someone...ela até as repetia muitas vezes, mas nem sempre dava para nos esquivarmos com graciosidade desse acontecimento.
Uma noite, estávamos na cozinha a preparar o jantar e a tv estava ligada na SIC, no telejornal. o apresentador estava a dar a notícia de que cientistas tinham descoberto uma bactéria que se encontrava no estômago ou intestino ou lá o que era, mas que era muito rara, blá, blá, blá, e não é que Someone - que havia entrado para mexer a sua mistela nutricional, vulgo sopa de bróculos - se vira para nós e diz, com naturalidade e num toque ligeiro de preocupação:
- Não é para parecer alarmista, mas acho que tenho aquilo, meninas.
Er....pois. Pois, claro que tem. Quer dizer, sabemos lá se tem ou não, mas achámos deveras interessante o luzir nos olhos de Someone ao proferir estas palavras...enfim, os desígnios das bactérias o dirão, talvez...Someone nunca mais falou na bactéria, mas outras coisas apareceram para iluminar a hipocondria de Someone...
Depois do curso não voltámos a ver Someone, mas no Natal ainda lhe mandamos um postal, porque ela pode ter sido muitas coisas, mas é uma pessoa que não merece ser esquecida. Claro que, na resposta ao meu postal me desejou festas felizes e contou do seu problema nas costas e em como tinha caído e partido a vértebra C-qualquer coisa, mas que se eu quisesse saber mais pormenores era só pedir à Nocas para ela me deixar ler o postal dela, que tinha mais detalhes, porque ela escreveu o dela primeiro.
Ahhh como sabe bem saber que há coisas que não mudam no mundo.
Necas